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Hora pico em São Paulo. O visual rendeu uma foto linda mas a sensação de asfixia e impotência é maior. |
O site SPressoSP da cidade brasileira de São Paulo publicou uma entrevista reveladora a Horácio Augusto Figueira sobre o caos do trânsito nessa metrópole, onde o paulistano paga a tarifa média de transporte público mais
cara do Brasil. Porém, mesmo pagando uma passagem
tão cara, convive diariamente com congestionamentos,
ônibus lotados e falhas recorrentes no sistema de transportes sobre trilhos. Figueira é engenheiro de tráfego e vice-presidente da Associação Brasileira de Pedestres, e este é um resumo de suas revelações e propostas para melhorar a vida do cidadão. Ele fala em São Paulo mas o que disse poderia ser referente a qualquer capital de América Latina (e outras regiões do mundo) onde as ruas não comportam mais carros nem se suporta mais tanta piora na qualidade de vida das pessoas.
– Como o senhor avalia o custo-benefício do transporte público em São Paulo ?
- Em termos de custo-benefício, fora do horário de pico, dá
para você usar como serviço comum. Nos horários de pico, por não ter velocidade
compatível nos corredores, os ônibus andam em baixa velocidade e lotados. Não é
um serviço de boa qualidade. Para reverter essa situação, teria que ser dada
prioridade total para os ônibus no sistema viário e, para isso, você tem que
incomodar o usuário de carro, não tem outro jeito. Não tem como conciliar
privilégios ao transporte coletivo sobre rodas sem tirar uma faixa dos
automóveis. Os R$ 3,00 que você paga hoje em São Paulo é uma tarifa
cara para um serviço de baixa velocidade comercial.
– Por que este custo-benefício ainda é tão caro?
- Pelo congestionamento imposto pelos automóveis, o poder
público não tem a coragem de falar que uma faixa de ônibus transporta dez vezes
mais pessoas que a mesma faixa ao lado de automóveis. A sociedade e a mídia
cobram que existem muitos congestionamentos, acho que ainda tem pouco. Eu
acabaria com o rodízio em
São Paulo , para a cidade sentir o que é a verdade do
automóvel.
Todo mundo quer andar de carro, mas não
existe espaço físico que comporte mais automóveis na cidade de São Paulo. Não
tem mais obra viária que vá resolver a questão da mobilidade por transporte
individual. Não tem alargamento de marginal, ponte ou túnel que dê conta.
Não sou contra o automóvel. Tenho
automóvel, mas me recuso a ir para o centro da cidade com transporte
individual. Não cabe, é um problema físico. Você consegue colocar cem pessoas
em 1 metro quadrado ?
Não consegue, e o que estão querendo fazer com o automóvel é isso. E não podemos desapropriar a cidade inteira para entupir
com automóveis.
Você vê o que aconteceu na Marginal
Tietê, a prefeitura e governo estadual investiram quase 2 bilhões de reais para
alargar a Marginal e os congestionamentos voltaram. Aí eles restringiram os
caminhões, e os congestionamentos voltaram. E agora, quem eles vão tirar? Os
pedestres? Vão acabar com as calçadas? Não tem o que fazer, a demanda é tão
grande que qualquer avenida inaugurada hoje, em um mês já vai estar entupida.
– Quais medidas poderiam ser implementadas para melhorar a qualidade do
transporte público?
- É preciso pegar o espaço viário, todo o que for
necessário, para implantação de uma malha de corredores viários. Parece que a
prefeitura anunciou a criação, até o fim do ano, de 140 km de faixas exclusivas,
o que não é a oitava maravilha do mundo, por operar na direita e ter muita
interferência, mas é melhor que nada. Até esperar que se construa um corredor
adequado, operando na esquerda, é benéfico operar a faixa exclusiva na direita,
que basta pintar, sinalizar e fiscalizar. Esta seria a primeira medida, deixar
o ônibus andar.
Por que as pessoas fogem
do ônibus, metrô e trens lotados, indo pro carro? Antes de tudo, pela
velocidade. Os ônibus não conseguem andar no horário de pico. Entre um carro
que não anda e um ônibus superlotado que não anda, as pessoas com renda maior
optam pelo carro, claro.
Precisamos pegar duas faixas no horário
de pico do corredor Nove de Julho, do Ibirapuera e do corredor
Consolação-Rebouças para operação do transporte coletivo, doa a quem doer,
porque vou conseguir transportar em duas faixas 20 mil pessoas por hora, quando
eu precisaria de 20 faixas de automóvel para transportar a mesma demanda. Uma
faixa de ônibus leva dez vezes mais clientes por hora que uma faixa de
automóvel. Basta a decisão política para que isso seja feito.
– Recentemente o candidato à prefeitura de São Paulo, José Serra, afirmou
que investir em ônibus em
São Paulo iria engarrafar ainda mais a cidade. O que o senhor
acha desta afirmação?
- Ele quis dizer que iria engarrafar o trânsito de automóveis. Mas na
verdade, é o contrário. São os automóveis que engarrafam o trânsito do
transporte coletivo e não deixam os ônibus andarem. É um viés. Precisamos
voltar aos bancos escolares para ter uma aula sobre o que é engenharia de
transporte de pessoas. O ex-governador Serra que me perdoe, mas quando eles falaram
que iriam alargar a Marginal Tietê eu avisei, em uma entrevista, que iam jogar
nosso dinheiro no lixo.
Nas 10 faixas da Marginal Tietê passam em média 15 mil
automóveis por hora. Se multiplicarmos esse número pela ocupação média de 1,4
passageiro em cada automóvel, dá 21 mil pessoas por hora. Qualquer engenheiro
da prefeitura sabe que uma faixa exclusiva para ônibus biarticulados consegue transportar, com um padrão
razoável de conforto, todas as pessoas que estão entupindo as 10 faixas da
marginal.
É só verificar o problema e aumentar
mais uma faixa para o transporte público pelo tempo necessário. E os
automóveis? Não estou mais preocupado com os automóveis. Se continuarmos
preocupados com automóveis não tem mais o que fazer. Posso investir um trilhão
de dólares em obras viárias em
São Paulo que nunca mais vou conseguir resolver o problema da
mobilidade.
Resumindo tudo o que estou falando: o
sonho do automóvel acabou na cidade de São Paulo. Ele foi bom há 40 anos,
quando era 1 em mil. Hoje ,
tem famílias que têm 8 veículos para fugir do rodízio, da veda. É o rodízio da
hipocrisia, você que é pobre não vai andar, mas eu que sou rico pego meu outro
carro.
O metrô e o trem vão resolver o
problema? Vão resolver os grande eixos de demanda, mas não da mobilidade de uma
cidade que tem mais de mil linhas de ônibus. Você nunca vai ter uma malha de
metrô de 2 mil quilômetros nem daqui a 1.000 anos. O sistema de ônibus é aquele
que sobe o morro, que atende as ruas de bairros, e muitos dos seus eixos têm
que ser estruturadores do sistema de transportes. Tem eixos que não
precisam de metrô.
Um corredor bem feito e bem operado resolve o
atendimento da demanda, basta que você tenha linhas tronco. Por exemplo, a
Rebouças, onde operam mais de 30 linhas de ônibus, teríamos que transformar em
quatro ou cinco linhas troncos com ônibus biarticulados, como se fosse um metrôzinho sobre pneus. Outra
medida é implantar um sistema de semáforo onde o ônibus converse com o semáforo
por radiofrequência para diminuir o vermelho. Londres implantou isso em 1977 e
diminui 30% no tempo de percurso, e Curitiba está com isso faz três meses em
todos os seus corredores.
|Via SPressoSP
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