* Por Marina Colerato
Desde a Revolução Industrial, no final do século 19, somos
bombardeados com a mensagem de que para sermos pessoas felizes, bem sucedidas e
plenas, devemos comprar os signos semióticos responsáveis por garantir esses
endossos capitalistas — carros, roupas, joias, celulares, etc. Fomos
programados para acreditar que a felicidade reside no ter.
Porém esse cenário está mudando a partir desta própria
percepção, que dá lógica ao consumo consciente. O lowsumerism indica uma
sociedade questionadora que busca novas formas de se relacionar com o mundo
contemporâneo.
Com esta consciência, renova-se a busca pela
espiritualidade. Nos últimos anos, um momento coletivo de maior introspecção
promove um olhar menos egoísta e menos autocentrado, capaz de enxergar a nossa
relação com o mundo e com as pessoas de maneira mais integrada.
Na abundância frenética de conexão da nossa sociedade, há
igualmente desconexão. Sem perceber, desconectamos de tudo — família, amigos,
sociedade, meio ambiente, de nós mesmos, daquilo que entende-se como deus ou
universo.
A busca contemporânea pela espiritualidade é observada em
hábitos cotidianos: a popularização do yoga-at-your-desk, a ascensão do
veganismo e da paz intestinal, a valorização da medicina integrativa… São
práticas que promovem, acima de tudo, autoconhecimento; estão distantes de
dogmas e mais próximas do “verdadeiro eu”.
São possibilidades de satisfação que conduzem a uma vida sem
as amarras sociais e culturais propostas pelo consumismo. Bens de consumo não
são suficientes para que nos identifiquemos como pessoas, de maneira completa e
verdadeira, e essa percepção é cada vez mais tangível. Afinal, quanto mais
possuímos, mais infelizes ficamos.
Por que agora?
O interesse do Ocidente pela espiritualidade não é novo.
Desde os anos 1960, a cultura pop dissemina filosofias orientais como o budismo
e seus ensinamentos milenares. Nos anos 1970, a espiritualidade foi uma das
forças que potencializaram os movimentos feministas, raciais e ecológicos.
Na filosofia moderna, Soren Kierkegaard, Jean-Paul Sartre e
Martin Heidegger afirmam que o Ser constrói-se a cada ação. Para os
existencialistas, não nascemos com uma finalidade definida: estamos
constantemente em busca de um propósito para preencher o vazio desta falta de
finalidade da existência.
Hoje, entre incertezas políticas e econômicas, queda da
confiança na governabilidade e ascensão dos movimentos sociais contra a maré do
conservadorismo, cresce a noção de que não nascemos apenas para pagar contas e
morrer.
A sociedade passa a se direcionar a um caminho de
questionamento em busca de respostas mais satisfatórias. Essa consciência
espiritualizada está vinculada à busca por um propósito maior.
“A árdua tarefa de compor uma vida
não pode ser reduzida a
adicionar episódios agradáveis.
A vida é maior que a soma de seus momentos.”
- Zygmunt Bauman -
É por meio dessa busca do propósito que dê sentido à
existência que, aos poucos, práticas espirituais ganham mais espaço na vida das
pessoas. O precioso tempo passa a ser gasto com um encontro consigo próprio em
busca de autoconhecimento. Ioga e meditação nunca foram tão populares. Retiros
espirituais, como o de Piracanga, tornam-se os novos destinos de desejo. A vida
cosmopolita e agitada, cheia de shoppings, lojas, bares e baladas, começa a
parecer menos interessante do que uma casa sustentável em uma ecovila.
Propósito no mercado de trabalho
Ser feliz, para o “eu” espiritualizado, está ligado a
colaborar com a felicidade dos outros e com a construção de um mundo melhor.
Pessoas com propósitos altruístas, em busca de um mundo bom para todos,
olham para além de si e se posicionam como agentes transformadores: amplificam
seus valores no mundo dos negócios com questionamentos sobre as fronteiras
entre trabalho, diversão e agente social.
Pessoas que encontraram seu propósito maior dão luz a
empresas que inspiram mudanças com objetivos que estão além do lucro
financeiro. São iniciativas que colocam em xeque a unanimidade do sistema
econômico atual com alternativas como capitalismo consciente, economia
solidária, negócios sociais, economia colaborativa, economia sustentável e pós-capitalismo.
Podemos concluir, então, que o encontro com o “eu” e com um
propósito maior a partir do autoconhecimento proposto pela espiritualidade, ou
a necessidade latente de preencher um espaço agora vazio, antes ocupado por
bens de consumo, é capaz de subverter a ordem dos tempos líquidos, cujas
premissas são insolidez e fugacidade. Os novos propósitos escapam à logica do
capitalismo e sugerem um estilo de vida mais inclusivo e menos focado em
acúmulo de capital.
“Não busque satisfação nos meios materiais ou desejos
oriundos. Busque a Bem-aventurança pura, indestrutível e incondicional dentro
de você, e você terá achado a Alegria sempre-nova.” — Paramahansa Yogananda,
fundador da Self-Realization Fellowship.
A era em que vivemos nos convida a instaurar novas, e mais
conectadas, maneiras de viver em sociedade. Da próxima vez que fizer uma compra
ou fechar um negócio, questione-se sobre o propósito daquela ação e se ela
traduz as verdades da sua alma e espírito.q
|| Via Ponto Eletrônico
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